23 de outubro de 2015

Debate entre autoridades e mães em situação de prisão abre oficialmente a Semana do Bebê no Rio de Janeiro

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Fotos: UNICEF/BRZ/Jackeline Nigri

Em uma varanda coberta, rodeada por um gramado e num dia de sol, se reuniram mulheres em situação de prisão, bebês, gestantes, familiares e integrantes do poder executivo, judiciário e de organizações da sociedade civil. Em comum, o desejo por diálogo, escuta, e a melhoria das condições de mulheres e seus filhos na Unidade Materno Infantil, em Bangu, unidade prisional responsável pela cautela das presas que dão à luz durante o período em que estão presas, e no presídio Talavera Bruce, que recebe às gestantes. Assim aconteceu a cerimônia de abertura da Semana do Bebê do Estado do Rio de Janeiro, na quarta-feira dia 22 de outubro à tarde, que contou com relatos emocionados de dificuldades e desafios, e com esclarecimentos e compromissos por parte do poder público.

Entre os relatos das mulheres em situação de prisão – muitas delas presas provisórias, ainda aguardando julgamento – histórias de angústia. Elas relatam demora na tramitação dos processos judiciais e pouco contato com os defensores públicos que cuidam dos seus casos. E um consenso entre os participantes:  que as boas condições de acolhimento das presas na UMI devem ser estendidas também às gestantes, todas reunidas em um único presídio, com atendimento humanizado, ambulância ou carro à disposição das emergências e partos, centralização dos serviços de saúde, oferta de alimentação adequada à especificidade da mulher em gestação e lactação, e espaço para o cuidado e desenvolvimento dos bebês. Atualmente, as gestantes ficam no presídio Talavera Bruce junto à outras presas, sem atenção diferenciada, realidade que o projeto de um Centro Integrado de Referência, que está sendo elaborado pelo Instituto Masan em conjunto com a SEAP, pretende mudar.

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Fotos: UNICEF/BRZ/Jackeline Nigri

Alimentação diferenciada e atenção ao parto

Um dos temas abordados no debate foi a saúde integral das gestantes, mães e bebês. Na roda de conversa, as presidiárias relataram casos de partos que aconteceram dentro do presídio por não ter tempo hábil para a chegada do carro que faria o transporte das mulheres até o hospital, e como seria importante contar com uma ambulância ou carro exclusivamente destinado a fazer esse transporte. Atualmente, quem faz o transporte das presas é o Serviço de Operações Especiais da SEAP, responsável por todos os deslocamentos de presos do sistema prisional do Estado. Outro fato relatado foi que funcionários insistem em algemar as presas em trabalho de parto que são levadas ao hospital. Maria da Conceição Salomão, representante da Secretaria de Estado de Saúde no debate, respondeu que as mulheres – mesmo em situação de prisão – tem direito a escolher um familiar ou qual pessoa vai acompanhá-la e o direito a movimentar-se livremente pelo quarto durante o trabalho de parto

Uma das gestantes se queixou do horário das refeições. “Nossa última refeição é às 17h, depois, só no dia seguinte, de manhã”. Vera Lúcia Alves, do Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro relata que estão participando da análise de um projeto de licitação para alimentação no sistema prisional, e propõe que o edital preveja uma oferta diferenciada para as gestantes e mães, semelhante à oferecida nos hospitais. E afirma a importância das mulheres grávidas receberem complemento vitamínico, o que não é feito. Ana Faulhaber, diretora da Unidade Materno Infantil afirma que as gestantes da UMI já recebem a alimentação hospitalar, reafirmando a importância de se integrar gestantes e mães com bebês em um único presídio, que atenda a especificidade das mulheres nestas condições.

Separação entre mães e bebês

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Fotos: UNICEF/BRZ/Jackeline Nigri

O processo de desligamento é um dos pontos levantados pelas presidiárias como motivo de angústia e apreensão. Pela lei, os bebês devem ficar com as mães pelo menos durante os seis primeiros meses, período de amamentação exclusiva. Após esse período, o poder judiciário, municiado por relatórios da equipe técnica do presídio, pode fazer o desligamento das crianças, que são recebidas pela família ou por abrigos. A questão apontada pelas mulheres é que muitas vezes sequer recebem visitas dos seus familiares, e tem medo sobre como seus bebês serão recebidos por pessoas com quem não mantiveram contato desde o nascimento. Uma das presas relata que tem outros três filhos, mas que sua família mora em outra cidade e que não tem dinheiro para vir visitá-la. Como favorecer um processo de desligamento e de acolhimento do bebê pelos novos cuidadores de uma forma mais saudável e segura para a mãe, as crianças e os familiares?

Rodrigo Cézar Medina, promotor de justiça do Ministério Público, esclareceu sobre a rede de informações sobre os familiares das presas, que conta com relatórios dos Conselhos Tutelares, dos Centros de Referência de Assistência Social, e pelas próprias equipes técnicas do presídio. No caso das mulheres que não tem família ou que a família não está apta a receber esse bebê, a solução seriam os abrigos ou o programa Família Acolhedora, que funciona em alguns municípios do estado, e que prevê o acolhimento dos bebês por um tempo determinado junto às famílias cadastradas e capacitadas. Um dos consensos entre os participantes do debate é a importância da SEAP ter um centro de localização, que facilite o trabalho das assistentes sociais e psicólogas do presídio no contato com os familiares, que em muitos dos casos sequer sabem que as mulheres estão presas.

Demora na tramitação dos processos e penas alternativas

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Fotos: UNICEF/BRZ/Jackeline Nigri

O terceiro tema do debate foi sobre possíveis penas alternativas para as mulheres grávidas ou com bebês recém-nascidos, e a possibilidade de que a Vara de Execução Penal dê prioridade aos casos das gestantes e mães de bebês no presídio. De acordo com dados da Unidade Materno Infantil, de 18 mães que estão no espaço, 11 são presas provisórias. Já segundo a Seap, das 28 gestantes presas, 25 aguardam julgamento. O Código de Processo Penal brasileiro prevê que a prisão preventiva pode ser substituída pela domiciliar em casos de gestantes a partir do sétimo mês ou de gravidez de risco. Raquel Chrispino, responsável pela Coordenadoria Judiciária de Articulação das Varas da Infância e Juventude e Idoso do Tribunal de Justiça, afirmou que não é possível continuar com o ritmo de penas privativas de liberdade atual, e que é preciso rever e repensar as respostas aos crimes. “Encarceramento é uma resposta, mas não é a única”, afirmou a juíza, que ilustrou seu argumento citando o grande número de processos que são analisados pela Vara de Execuções Penais (VEP): 110 mil. “Precisamos pensar na substituição das prisões por medidas alternativas”. Raquel Chrispino se comprometeu a levar ao Tribunal de Justiça uma proposta para que a VEP dê prioridade na avaliação dos casos das internas, de acordo com o preceito constitucional da prioridade absoluta do direito das crianças.

O Secretário de Administração Penitenciária Erir Costa Ribeiro relatou os muitos desafios da gestão do sistema prisional, e afirmou que mais de 18 mil presos no estado do Rio de Janeiro são provisórios, o que revela a importância do Poder Judiciário reavaliar o volume de prisões que determina e a velocidade na apreciação dos processos.

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Parceiros da Semana do Bebê do Rio de Janeiro: Unicef, Rede Nacional Primeira Infância, Fundação Xuxa Meneghel, SEAP e Secretaria de Estado de Saúde do RJ

A 1ª Semana do Bebê Estadual é uma iniciativa do Governo do Estado, por meio da Secretaria de Administração Penitenciária (SEAP). Conta com o apoio da Secretaria Estadual de Saúde, do Rio Solidário, do Instituto Masan, da Fundação Xuxa Meneghel, da Rede Nacional Primeira Infância (RNPI) e sua secretaria executiva (CECIP) e UNICEF. A Semana do Bebê é uma agenda proposta pelo UNICEF a estados e municípios para que promovam uma grande mobilização em favor da primeira infância, e tem programação até o domingo, dia 25 de outubro.

Rosa Maria Mattos

Assessora de Comunicação da Rede Nacional Primeira Infância

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