12 de fevereiro de 2015
“Não Bata, Eduque” comenta declaração do Papa Francisco sobre palmadas
Em fevereiro, uma declaração do Papa Francisco sobre palmadas nos filhos repercutiu internacionalmente. O comentário aconteceu durante uma audiência geral no Vaticano sobre o papel do pai na família, em que o Papa exaltava a participação dos homens na criação dos filhos e apontava a necessidade de uma figura paterna próxima, doce e firme. No entanto, saindo do texto preparado, o Papa Francisco disse: “uma vez, durante uma reunião, ouvi um pai dizer: ‘às vezes dou umas palmadas em meus filhos, mas nunca no rosto para não humilhar’. Isso é bonito, tem um senso de dignidade. Ele deve punir, e de maneira justa”. A declaração foi criticada por organizações no mundo inteiro mas também recebeu apoio de centenas de pessoas nas redes sociais.
Enfrentar a violência contra as crianças é uma das missões da Rede Nacional Primeira Infância e está prevista como ação finalística do Plano Nacional pela Primeira Infância. Além disso, é tema do “Guia de Proteção e Prevenção às Violências na Primeira Infância” elaborado pela RNPI.
Para falar sobre o tema, convidamos a coordenadora da rede nacional “Não Bata, Eduque”, Marcia Oliveira, que não acredita ser possível “bater com dignidade” e alerta que qualquer violência cometida contra as crianças pode comprometer seu desenvolvimento físico e emocional. A rede “Não Bata, Eduque” participou ativamente da apresentação e tramitação da Lei Menino Bernardo (Lei 13.010/2014) aprovada no ano passado, que prevê que a União, os estados e os municípios devem atuar de forma articulada na elaboração de políticas públicas e na execução de ações destinadas a coibir o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante e difundir formas não violentas de educação de meninos e meninas.
– Qual a repercussão que o depoimento do papa sobre a educação infantil pode ter na sociedade brasileira, tendo em vista o investimento dos movimentos sociais para a aprovação da Lei Menino Bernardo?
A declaração do Papa sobre a educação infantil apresenta um aspecto ainda muito corriqueiro no “senso comum” que vincula a “firmeza” ou “autoridade” com um certo grau de violência física ou psicológica.
Nas notícias sobre as repercussões da fala do Papa também aparecem declarações que trazem à tona esse senso comum, como por exemplo: “um padre da Santa Sé perguntou: quem nunca bateu num filho ou apanhou dos pais?” Pelo que li o Papa Francisco já tentou desfazer o mal–entendido.
O Papa Francisco é reconhecido como uma liderança mundial que busca a paz, o respeito e a resolução pacífica de conflitos, por isso, acreditamos que ele possa juntar-se a aos movimentos sociais que lutaram pela aprovação da Lei Menino Bernardo e ajude a impulsionar um novo paradigma do processo de educação-socialização das crianças, onde os castigos físicos e humilhantes deixem de ser utilizados e estratégias de educação e disciplina não violentas sejam privilegiadas.
– Quais são as formas de violência contra crianças mais comuns, e em quais locais costumam acontecer?
Os dados do Disque Direitos Humanos (Disque100) apontam que os quatro tipos de violência contra crianças mais comuns são: negligência, violência física, violência psicológica e violência sexual. Segundo às denúncias, os locais onde essas violências costumam acontecer são os ambiente de proteção e cuidado de crianças e adolescentes, ou seja, suas casas, escolas, creches, abrigos, comunidade, etc.
– O que um pai ou mãe pode fazer para educar seus filhos com firmeza e sem usar violência?
Ser firme não é ser violento. Os pais podem e devem ser firmes com seus filhos, cobrando os acordos e regras acordados com as crianças e adolescentes, estabelecendo uma rotina onde a disciplina e os limites possam ser aprendidos, sendo um exemplo positivo para seus filhos, demonstrando coerência entre o discurso e a prática no processo educativo e de socialização de seus filhos.
– O que pode ser feito para combater a violência cometida contra as crianças em suas casas, escolas e demais espaços públicos?
Precisamos entender que não existe “palmada pedagógica”, toda e qualquer violência cometida contra as crianças podem comprometer seu desenvolvimento físico e emocional. Quando você bate em uma criança a ensina a bater e que a violência pode ser utilizada em determinadas situação.
As pessoas devem buscar informações de como educar e disciplinar sem violência e comprometer-se com o processo educativo e de cuidado, não só de seus filhos, como a de todas as crianças.
A Lei Menino Bernardo busca apresentar algumas alternativas para o enfrentamento aos castigos físicos e humilhantes contra crianças, como o oferecimento de políticas públicas de prevenção voltadas para as famílias, a formação continuada dos profissionais do Sistema de Garantia de Direitos (SGD), o desenvolvimento de campanhas de educação e sensibilização, a divulgação de estratégias de não violentas de resolução de conflitos, etc.
A Rede Não Bata, Eduque vem atuando na sensibilização de pessoas e profissionais que possam contribuir para a mudança cultural de longo prazo que é a construção de uma educação não violenta para nossas crianças. Pediatras, professores, assistentes sociais, psicólogos, conselheiros tutelares, profissionais do SGD, organizações da sociedade civil, lideranças religiosas e comunitárias, etc. podem e devem contribuir para a disseminação de práticas educativas não violentas, de informações sobre o desenvolvimento infantil, e outras informações que possam ampliar o rol de possibilidades educativas não violentas das famílias brasileiras.
Comunicação / Rede Nacional Primeira Infância
(Com informações da AFP, da Agência Ecclesia e da Secretaria de Direitos Humanos)