21 de maio de 2013

“Brincar é um desafio político”, avalia gestora da Aliança pela Infância

A ideia de que as crianças precisam ocupar o tempo com um monte de cursos, numa agenda que parece imitar a dos adultos, causa arrepios a Giovana de Souza, gestora da rede Aliança pela Infância, criada em 1997 na Inglaterra e que atua no Brasil desde 2001.

Ela também defende que as brincadeiras não precisam ser direcionadas por recreadores ou pais ansiosos. “Se não for assim, a criança irá contribuir com o quê? O mais grave é que se ela não exercita a criatividade na primeira infância, quando isso vai acontecer? É por meio do brincar que a gente descobre o mundo e se conecta com a essência do humano”.

O discurso será posto em prática na quarta edição da Semana Mundial do Brincar, que começa neste domingo (19) e vai até o dia 26 em diversos estados do país, estendendo a bandeira das brincadeiras livres.

Em São Paulo, serão cerca de 90 atividades em praças, parques, ruas, bibliotecas, hospitais e nas unidades do Sesc, parceira do projeto. A abertura será no Sesc Itaquera (zona leste), com apresentações da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, às 8h, e do coral Materna em Canto, no Parque das Bicicletas (zona sul), às 11h.

Na programação estão o resgate de brincadeiras antigas –como as que terão no Jardim Pantanal (zona leste) no dia 25, com amarelinha e cabra-cega–, rodas de jogos, contação de histórias, oficinas, piquenique e palestra.

A banda Pato Fu encerra o evento com o show “Música de brinquedo”, com a participação dos bonecos do grupo Giramundo, no dia 26, às 16h, também no Sesc Itaquera.

A semana ocorre às vésperas do Dia Mundial do Brincar, comemorado desde 1999 em 28 de maio.

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ABAIXO, CONFIRA ENTREVISTA COM GIOVANA DE SOUZA, GESTORA DA REDE ALIANÇA PELA INFÂNCIA:

sãopaulo – O evento terá uma roda de conversa para discutir os “desafios do brincar”. Qual é a maior dificuldade hoje?
Giovana Souza – O grande desafio é o respeito por essa ação. Não temos espaços adequados para que as crianças possam brincar. E nós, adultos, temos uma ansiedade muito grande, o que faz com que nossos filhos tenham contato com o brincar de uma forma dirigida, muitas vezes por meio de recreadores. Há pouco respeito pela atividade quando ela tem um fim em si mesma. As crianças acabam tendo agendas cheias, mas há pouco espaço para estarem sozinhas e se divertirem.

A situação se repete nas escolas?
Sim, mas é uma conquista no âmbito da educação infantil que nossos professores tenham uma formação que contemple o brincar. Isso é importante. Por outro lado, quase não há tempo para se divertir livremente. Temos apenas o recreio, que não é muito longo, gira em torno de 15 minutos. É preciso tempo para trabalhar com a imaginação, para inventar brincadeiras e brinquedos não-estruturados.

Qual deve ser o papel dos adultos nas brincadeiras?
A criança demanda uma atenção e os pais devem atuar como mediadores. Ter atenção com o espaço onde os filhos vão brincar, ver se o local é seguro, se não tem cacos de vidro, essas coisas. Depois de preparar o ambiente, os pais devem respeitar o tempo para que a brincadeira aconteça, sem dirigir aquela atividade. É um desafio para nós, talvez porque a gente tenha esquecido como é… Nossa vontade é entrar logo na situação e direcionar, esquecendo nosso papel de observador. Se não for assim, a criança irá contribuir com o quê? O mais grave é que se ela não exercita a criatividade na primeira infância, quando é que isso vai acontecer? É por meio do brincar que a gente descobre o mundo e se conecta com a essência do humano.

Como as crianças brincam nas diferentes regiões de São Paulo?
As mudanças nas brincadeiras estão muito relacionadas às questões de segurança. As crianças da periferia ainda brincam nas ruas com outros meninos e meninas e isso é muito importante, porque exercitam uma série de vivências, como a capacidade do perdão. Uma criança que more no centro, por exemplo, e não encontre espaços adequados para brincar, tende a ficar em casa ou ir a casa de um amigo. A característica dessa brincadeira muda. Não dá para brincar de pega-pega em casa, ou pelo menos é mais difícil.

Que estratégia é possível adotar para que as grandes cidades tenham bons lugares para brincar?
Esse é um desafio político. O ator “criança” não é considerado no planejamento das cidades. As calçadas são esburacadas, são poucos os espaços de convivência coletiva seguros para que crianças e bebês possam brincar. Temos algumas iniciativas de ocupação de praças, mas essa não é a regra e aí ficamos reféns da insegurança.

Do que você brincava quando era pequena?
De passa anel, casinha, balança caixão…

Informações Folha S.Paulo

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